Conhecido da maioria dos portugueses pelos seus automóveis 100% elétricos, o maior construtor mundial de modelos eletrificados lança em território nacional o seu primeiro híbrido Plug-In. Em avaliação, o BYD Seal U DM-i Boost, a versão de acesso à gama do SUV concorrente no segmento D, com tração dianteira, 218 cv e vários predicados invejáveis em termos de custos de utilização.
Mais conhecida dos europeus, em geral, e dos portugueses, em particular, pelos seus modelos totalmente elétricos, à BYD faltam propostas que a ajudem a vingar num mercado em que os 100% elétricos tardam a impor-se. Nada que aflija muito o maior construtor mundial de automóveis eletrificados, pela panóplia de soluções de motorização que tem no seu banco de órgãos mecânicos, provando-o, por exemplo, o Sport Utility Vehicle (SUV) do segmento D que acaba de lançar em território luso, disponível tanto em versões exclusivamente elétricas como em duas híbridas Plug-In (PHEV): uma com dois motores elétricos, tração integral e 319 cv; outra, mais acessível, com tração dianteira e 218 cv, denominada Seal U DM-i Boost. É esta que analisamos.
Avaliar a novel criação da marca chinesa obriga, desde logo, quem já conhece a sua oferta, a olvidar, tanto quanto possível, a respetiva designação: apesar de partilhar o nome, e, até, a plataforma, com o melhor dos seus modelos à venda na Europa, a verdade é que o paralelismo entre o Seal e o Seal-U não vai muito para além disso, não fora mais um ou outro pormenor. Evidencia-o, logo à partida, o desenho exterior, que, não obstante um certo ar de família (insere-se, como o do Dolphin e o do Seal, na Ocean Series da BYD, inspirada em motivos marinhos), não só não deriva diretamente do da berlina, ao contrário do que tantas vezes sucede neste domínio, como não esconde as suas origens orientais, acabando por ser algo anónimo, e carente de uma personalidade e de um carácter mais marcantes. Não desagradando à vista, dificilmente será o fator de compra mais decisivo.
Bom acolhimento
Em compensação, para o muito acolhedor interior sobram elogios, pois, mesmo que a decoração e o refinamento fiquem aquém dos que encontramos no Seal, a perceção de qualidade é muito boa, por via da montagem robusta, da correção dos acabamentos, e do recurso a plásticos macios e pele sintética – não esquecendo um equipamento de série quase interminável, em termos de segurança, conforto e conetividade. Menos habitual, em modelos que partilham a plataforma, é a distância entre eixos ser inferior à do Seal, mas os 2,765 m são suficientes para garantir uma ótima habitabilidade, nomeadamente atrás, em que os únicos reparos vão para o lugar central menos cómodo, e para o piso plano, mas elevado, a não permitir que as pernas dos ocupantes do banco traseiro fiquem devidamente apoiadas nos respetivos assentos, o que poderá causar algum cansaço nas deslocações longas. Quanto à capacidade da bagageira, a variar entre 425-1440 litros, é suficiente para acomodar os pertences de uma família tradicional em viagem.
Já o posto de condução não precisava de ser tão elevado, mesmo tratando-se de um SUV, mas a ergonomia não merece críticas de maior (pena o excesso de botões, físicos e hápticos, instalados em redor do comando da transmissão), e os bancos dianteiros são bastante confortáveis, ainda que fosse bem-vindo um maior apoio lateral.
O pequeno seletor da transmissão, em cristal, acaba por conferir um certo toque de requinte ao habitáculo; o carregador por indução para “smartphones” não deixará de agradar aos que não dispensam estar sempre ligados ao mundo exterior; sendo ainda impossível não reparar no painel de instrumentos digital com 12,3”, e no enorme ecrã central rotativo com 15,6”, para mais rotativo – tanto pode estar colocado na vertical, como na horizontal, atributo de discutível aplicação prática, que não seja para visualizar filmes ou imagens quando o Seal U está imobilizado, mas de efeito sempre espetacular, pois basta pressionar um botão no volante para alternar entre as duas posições.
Menos convincente é a interação entre estes dois elementos, ambos tão completos, e repletos de funções, como pouco práticos de utilizar. Os caracteres de reduzidas dimensões não facilitam a leitura; a lógica do sistema também não é muito evidente; e nem sempre é linear, por um lado, perceber a utilidade de algumas funcionalidades, e, por outro, selecionar aquela que se pretende. Tirar todo o partido do sistema obriga a bastante habituação, e, até que tal aconteça, frequentemente, é necessário retirar os olhos da estrada por longos momentos, o que está longe de ser o mais recomendável, sendo disso exemplo o computador de bordo, que informa acerca do consumo médio nos últimos 50 km, sendo necessário percorrer essa distância para obter um valor válido. O que não muda é a “alternância” entre o português de Portugal e o do Brasil, e a respetiva qualidade, para as instruções e informações fornecidas, dependendo da funcionalidade que as fornece…
Estreia lusa
Com a chegada do Seal U, a BYD disponibiliza em Portugal o seu primeiro modelo que não 100% elétrico. Nesta versão de acesso, anima-o um grupo motopropulsor composto por um 4 cilindros atmosférico a gasolina, com 1,5 litros, 98 cv e 122 cv, coadjuvado por um motor elétrico com 197 cv e 300 Nm, integrado na caixa de variação contínua e-CVT, e alimentado por uma bateria de fosfato de ferro-lítio (dispensa o cobalto e o níquel enquanto materiais – mais raros e caros – de cátodo, ou elétrodo negativo, substituindo-os, entre outros, pelo ferro), para um rendimento combinado de 218 cv e 300 Nm.
À disposição do condutor estão os modos de funcionamento híbrido (ativado por omissão) e 100% elétrico, e, estando este último selecionado, o Seal U DM-i Boost logrou percorrer, em condições reais de utilização, antes de ser necessária a intervenção do motor a gasolina, 52 km em autoestrada, 79 km em estrada, e 93 km em cidade (algo longe dos 113 km anunciados pela BYD, mas, ainda assim, um registo apreciável). com a vantagem adicional de, esgotada a capacidade útil da bateria, os consumos de gasolina serem sempre bastante contidos, ficando, em média, na casa dos 6,0 l/100 km.
O carregamento total da bateria demora 2.00 horas numa ligação a 11 kW de corrente alternada, sendo precisos 35 minutos para recuperar 80% da carga num posto rápido de corrente contínua a 18 kW. A funcionalidade V2L, que permite alimentar dispositivos elétricos exteriores a partir da bateria de alta tensão do veículo, é de série. E lamenta-se que não exista forma de fazer variar a regeneração de energia em desaceleração, tanto mais que a retenção, quando se liberta o pedal do acelerador, é pouco intensa.
Dupla face
Na prática, e como seria de esperar, é em meio urbano que o Seal U DM-i Boost mais brilha. Em qualquer dos modos de funcionamento da unidade motriz, e seja qual for o modo de condução escolhido (Eco, Normal, Sport e Snowfield), até porque não são sensíveis diferenças de maior entre eles, a resposta ao pedal do acelerador é sempre imediata e intensa, mas fácil de dosear, além de que a capacidade da bateria raramente baixa dos 25% (recarrega-a o sistema de regeneração de energia ou o próprio motor a gasolina), o que permite arrancar sempre em modo 100% elétrico, e dispor do motor elétrico para ajudar nas situações mais exigentes. Outro ponto a reter é o extremo conforto de marcha, mesmo em pisos demolidores, que a suspensão enfrenta com indiferença, tendo sido esta, nitidamente, a grande prioridade na afinação do chassis, o que não deixará de ter consequências noutros domínios, como adiante se demonstrará.
Em estrada aberta e em autoestrada, é, também, a partir dos 25% de carga da bateria que o modo elétrico entra automaticamente em ação, mas, se o ritmo de condução for intenso, e existirem poucas variações de velocidade, o nível de carga pode baixar dos 15%, acabando por ser reduzida, ou nula, a disponibilidade do motor elétrico para contribuir para a locomoção. Algo que, de início, pode causar alguma surpresa, mormente nas ultrapassagens, por via de uma resposta bem mais anémica, traduzida numa maior lentidão nas retomas de velocidade. Menos mal que a boa insonorização do habitáculo impede que seja mais audível a sonoridade algo esforçada do motor a gasolina, situação potenciada, como é da praxe, pela transmissão de variação contínua.
O conforto, esse, continua a ser de nível superior, só que a afinação muito macia da suspensão, nitidamente menos “europeia” que a do Seal, mostra o reverso da medalha quando o ritmo de condução aumenta. A par da sensibilidade aos ventos laterais, permite um assinalável adornar em curva, e mais oscilações da carroçaria, tanto maiores quando mais intensas forem as trocas de apoio, e o curso dos amortecedores facilmente se esgota nas solicitações mais exigentes, tudo concorrendo para uma excessiva, e prematura, tendência para a subviragem quando se enfrentam traçados mais sinuosos a ritmos mais empenhados.
Conforto de nível superior
É verdade que os ditos não serão, nunca, a principal vocação de um SUV de médio porte de cariz iminentemente familiar, e quase duas toneladas de peso, mas não o é menos que, neste particular, a BYD já demonstrou ser capaz de satisfazer bem melhor as exigências típicas dos consumidores do Velho Continente – ficando por saber se uma versão dinamicamente mais apurada (como a comercializada noutras paragens, sob a designação Song L e com formato mais desportivo) não terá cabimento também na gama em Portugal. Decididamente a melhorar, o tato muito artificial e vago da direção lenta e excessivamente leve (em qualquer dos dois níveis de assistência, elegíveis, “algures”, nos menus do sistema multimédia), e, sobretudo, o funcionamento do ABS em travagens fortes a velocidades mais elevadas, em que o Seal U DM-i Boost não só afunda bastante a frente, como percorre bastantes metros com as rodas bloqueadas, alongando muito a distância de imobilização.
Distante do mais competente dos BYD, o Seal U DM-i Boost não passa a ser, por isso, um automóvel inseguro, ou difícil de utilizar. De todo. Apenas é pouco envolvente e interessante de conduzir, a não ser da forma para que foi concebido – SUV assumidamente familiar –, não o favorecendo a comparação com o homónimo de três volumes e quatro portas, algo que ocorreria em muito menor escala caso a opção do Marketing da marca chinesa tivesse sido outro quando do respetivo batismo europeu (chama-se Song Plus no mercado de origem).
UM preço de 40.169 €, um equipamento de série em que nada falta, e uma garantia de 6 anos ou 150.000 km
Em contrapartida, oferece muito espaço, um interior de bom nível, um excelente conforto, e uma motorização capaz de conjugar um desempenho convincente na esmagadora maioria das situações com uma assinalável autonomia elétrica e consumos comedidos. Junte-se a isso um preço de 40.169 €, um equipamento de série em que nada falta, e uma garantia de 6 anos ou 150.000 km (8 anos para o sistema elétrico – ou 150.000 no caso do motor, e 200.000 km no caso da bateria), e estão reunidos os ingredientes essenciais para poder conquistar uma clientela muito específica e que valoriza mais a razão do que a emoção.
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